O simbólico entre a ficção e a realidade: La casa de papel e o isolamento social

Antes do texto, três coisas:

1. Advertências: Este texto contém spoiler da série e alguns pontos de vista pessoais;
2. Novidade: Ativei os comentários, caso queiram deixar as suas impressões, você escreve, eu confiro, e sua opinião pode ser publicada abaixo do texto;
3. Lembrete: não deixem de ler o folheto (clique aqui) e realizar a atividade.


Não havia como este professor estar distraído da – muito aguardada – estreia da quarta parte da série La casa de papel. Muitas foram as expectativas deixadas pela terceira parte que esperava, como muitos de você, ver se desenrolarem. Esta série, para além de nos entreter, aos meus olhos, nos dá possibilidade de fazer muitas discussões em direção a Filosofia. São muitos os dilemas éticos-morais, afetivos, sociais, psicológicos, jurídicos, literários, dentre outros, muito bem articulado por Alex Pina, autor da trama.
Contudo, esse não será um comentário sobre as minhas impressões dessa última parte. Não irei – apesar das afetações – discorrer opinião sobre a morte de Nairóbi, sobre faltas ou exageros no enredo. Tão pouco irei conspirar sobre eventuais novas partes. Minha intenção é escrever observando um pequeno detalhe na fala de Najwa Nimri (odiada inspetora Alicia Sierra).
No documentário La casa de papel: el fenómeno, seguinte  ao – eletrizante – último episódio, Najwa  diz: “se fizessem [a serie] com roupas normais, sem máscaras e [sem a música] ‘Bella Ciao’ tenho certeza de que não teria o mesmo impacto”
Tal fala resume o simbólico da série. O “iconográfico”, ainda nas palavras da atriz. Além dela, diretores e produtores da série atribuem - eu concordo – que o simbólico é um fator determinante do sucesso internacional dessa produção. Sem os macacões vermelhos, a máscara de Dali e “Bella Ciao”, La casa de papel seria mais uma entre tantas séries disponíveis no catálogo que não tem a mesma expressividade, sobretudo nos países latinos.
E é justamente no simbólico que a trama e a realidade se cruzam. Como mostrado também no documentário, os símbolos da série foram ressignificados e utilizados para defesa de diversas causas mundo a fora: o que isso nos diz?
Bom, estando (quase) todos isolados, autoprivando-nos de muitas atividades e proibidos em outras – tudo isso para minimizar os efeitos drásticos da COVID-19, com o qual vamos lutar por muito tempo. Isso porque não é exagero dizer que o coronavírus nos força a repensar e mudar muito de nossa vida, do nosso cotidiano.
Essa mudança nos leva aos símbolos. Que sons, cores e expressões estão nos enchendo de significado nesse momento de nossas existências? Quais vozes e atitudes estão influindo no modo como nós estamos enxergando as coisas? Somos afetados por esperança? Por responsabilidade? Por impulsos ou por medos?
Ainda é necessário pensar, como as autoridades públicas (presidente, congressistas, governadores, prefeitos e as demais), da comunicação (TVs, jornais, revistas, mídias sociais em geral); como nossos familiares, amigos, e nós mesmos estamos significando tudo isso?
Eu entendo que existem correções a serem feitas em vários pontos, e já. A imagem (que é um símbolo forte) que algumas pessoas construíram na e da política brasileira nos últimos tempos é um desses símbolos que precisamos aproveitar a onda de mudança que o vírus nos impõe para resolver.
Não podemos estar reféns de mitos ou semi-deuses que se apegam ao poder e a projetos próprios e que, em horas como essa, não são capazes de pôr de lado as diferenças para focar no principal: salvar vidas, minimizar os problemas, socorrer os que a desigualdade construída nessa nação por séculos, estampa estarem gravemente fragilizados.
O vírus, além de um grave problema de saúde, é também um símbolo. Ele nos mostra que o sistema (outro tema caro a nossa série) é cruel e cínico. Detalhe: o sistema não é um ente metafísico, ele é formado de pessoas, em La casa de papel, por exemplo: o Governador do banco (Pep Munné), Coronel Prieto (Juan Fernández), Coronel Tamayo (Fernando Cayo), dentre outros.

Para concluir - este comentário, não as reflexões -, sempre inspirado na trama que nos deixa com a pulga atrás da orelha, pergunto: os bilhões de reais que virão (já deviam ter chegado!) em socorro de nossa população, eles só apareceram agora? Não existiam antes? Ou, só agora alguém percebeu que existe um enorme grupo de pessoas em situação de risco no país?

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